terça-feira, março 13, 2007

Relatório Arnault - breve comentário (Parte II)


No seguimento da primeira parte, já aqui publicada, passamos a apresentar a ultima parte do trabalho realizado.

Recentemente foi divulgado um extenso, complexo e completo relatório sobre o qual alinhavámos algumas notas, entre muitas outras possíveis, que se julga, no contexto conturbado em que o futebol português se encontra, serem oportunas mencionar:

1ª nota - A necessidade de uma ampla abordagem política, a nível europeu, sobre o Modelo de Desporto;
2ª nota – Avaliar o reconhecimento e a especificidade do desporto no velho continente;
3ª nota – Fornecer um quadro legal compreensível e sólido para o desporto em geral e o futebol em particular e de acordo com a interpretação da jurisprudência existente e com os princípios políticos assentes em Nice;
4ª nota –O significado da especificidade desportiva e nessa perspectiva a estrutura em pirâmide será o elo forte entre as bases e o desporto profissional ao mais alto nível;
5ª nota – O facto e em função da situação difícil e problemática instalada, de se constatar que é possível no futuro actuar e naturalmente corrigir as situações anómalas,
6ª nota – O facto de uma das características futuras no modelo europeu do desporto ser a solidariedade financeira (financiamento das bases) e a “promoção e relegação (sistema aberto)”;
7ª nota – A incerteza jurídica criada pelo aumento significativo da litigação, tendo esta sido instigada por via de o vértice superior do desporto, o futebol, se ter transformado num fortíssimo negócio (ex. o “Acórdão Bosman” e à nossa escala o “Caso Mateus”);
8ª nota – A imprescindibilidade de que seja criado um ambiente legislativo mais estável como suporte adequado de um desporto que se pretende digno, moderno e próspero;
9ª nota – O facto também importante (“aspecto - chave do Desporto”), é a de se garantir de que para a gestão atempada existam níveis adequados de autonomia das entidades responsáveis pelo governo desportivo. Claro, defendendo sempre o principio que o desporto não pode estar acima da lei. O direito de recurso para um Tribunal Arbitral do Desporto será sempre uma garantia adicional. De referir ainda que a declaração de Nice e sobre este assunto, reconhece já a especificidade do desporto.

Sobre a aludida especificidade, aponta-se para 3 agrupamentos :

– Regularidade e funcionamento adequado das competições;
- Integridade do desporto;
- Equilibro competitivo.

Quanto ao primeiro agrupamento é importante conquistar equilíbrios competitivos e de funcionamento adequados e que tem a ver com: (a) fixação dos prazos razoáveis para as transferências dos jogadores; (b) estimular a assistência de espectadores nos jogos; (c) conseguir que as melhores equipas estejam sempre disponíveis e operacionais para disputar as competições com maior prestigio (por ex. ao nível de selecções) e com isso garantir, “à priori”, a participação dos seus melhores atletas; (d) conseguir efectuar com regularidade o controlo antidoping.

Quanto ao segundo agrupamento é importante desenvolver o sistema de licenciamento dos clubes de forma a melhorar os níveis de gestão, transparência e integridade financeira.
É importante também desenvolver um sistema próprio de regulação da actividade dos agentes dos jogadores.

No que se refere ao terceiro agrupamento é necessário tomar medidas para proteger e promover a competição de forma equilibrada e equitativa e não ceder às “pressões normais do mercado” i/é sujeitas, apenas, ao poder do dinheiro, a saber: (i) proteger os jogadores e as entidades locais responsáveis pela sua formação; (ii) garantir a redistribuição financeira do negócio e assim reforçar as capacidades competitivas dos intervenientes; (iii) controlar os custos salariais – criando por exemplo a obrigatoriedade de os clubes pagarem uma taxa de redistribuição sempre que se excedessem os limites aplicáveis;

10ª nota – Tendo como exemplo o futebol, o modelo europeu de desporto baseia-se numa estrutura piramidal, a saber (por ordem decrescente i/é do topo para a base):

-Federações Europeias;

-Federações Nacionais;

-Ligas Nacionais;

-Associações Regionais e Locais;

-Clubes;

-Desporto Amador;

11ª nota – A necessidade de os adeptos estarem convenientemente representados no que diz respeito à defesa dos seus direitos e pontos de vista;
12ª nota – Importante também é a transparência e a responsabilização quanto á forma como o dinheiro redistribuído é gasto;
13ª nota – A UEFA como entidade governativa desportiva não deve, no contexto da sua actividade, ser um actor interessado, mas antes uma instituição encarregada de conciliar os vários interesses concorrentes e assim satisfazer os interesses globais do desporto ao nível europeu;
14ª nota – Para garantir o funcionamento eficiente da globalidade do sistema é necessário abordar e tratar alguns aspectos críticos, designadamente:

· A questão da propriedade que não está uniformizada, existindo actualmente vários modelos a operar com as respectivas vantagens e desvantagens inerentes. A uniformização, porventura, até não será aconselhável. Antes será preferível adoptar os sólidos princípios de gestão financeira e transparência nos clubes;

· Um maior envolvimento organizado dos adeptos de forma a estimular a sua participação activa;

· O licenciamento dos clubes de forma a introduzir maior disciplina financeira na gestão dos clubes de futebol;

· A questão do controlo de custos salariais como forma, essencial, para garantir a boa saúde financeira dos clubes;

· A par dos clubes a necessidade de controlar e organizar mais eficientemente a gestão e a actividade das autoridades desportivas. Tanto as nacionais como as internacionais devem ser, nos seus exemplos quotidianos, permanentemente exemplares;

· Combater implacavelmente o tráfego de jogadores jovens;

· Combater também implacavelmente o racismo e a xenofobia;

· Intensificar o combate a todas as formas de violência, melhorando as questões de segurança e a integridade dos estádios,

· Serem criados os instrumentos reguladores necessários de forma a controlar-se eficazmente as matérias de concorrência, o
marketing centralizado de direitos televisivos, a formação dos jovens, a libertação dos atletas para as selecções nacionais, tectos salariais, e sistemas de licenciamento dos clubes;
15ª nota – A proposta para que seja criada uma Agência Europeia de Desportos a qual poderá e deverá actuar como entidade de ligação entre as entidades governativas desportivas na Europa. Esta agência terá, exclusivamente, uma função de repositório de informação;
16ª nota – Várias recomendações: (a) às Instituições da União Europeia e aos seus estados membros (quanto ás regras desportivas compatíveis com a legislação comunitária); (b) às Autoridades Europeias do Futebol; (c) ás instituições da UE e às Autoridades Europeias do Futebol (para que funcionem em cooperação);
17ª nota – À laia de conclusão final referir a necessidade de se estabelecer uma estrutura formal de relacionamento entre as instituições pertencentes à UE e a entidade governativa do futebol e agir rapidamente no sentido de combater: a corrupção; a falência financeira de muitos clubes; a violência e o doping.

Por último e à laia de convite para dizer, atendendo aos dias difíceis porque passa o desporto português e em particular o futebol, que é urgente “agarrar” nestes importantes contributos e procedermos com a celeridade possível à sua discussão participada e qualificada com vista à implementação das reformas necessárias.
Vamos a isso, o tempo urge.


Pedro Vieira (pedro.vieira55@gmail.com)